COLUNA Adriano Lima Neves

2022: UMA ELEIÇÃO CIVILISTA?

Por Adriano Lima Neves
A eleição presidencial deste ano de 2022 no Brasil, que acontecerá no próximo 
domingo, se tornou, mesmo bem antes do início das campanhas, uma eleição 
extremamente polarizada, principalmente entre os candidatos Lula e Bolsonaro. Para muitos, é a mais polarizada da história do país.

Inicio o meu texto desta sexta-feira propondo uma reflexão aos caros leitores de O Leopoldinense, e citando uma máxima que existe há muito tempo sobre o estudo da história no mundo: “o povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la”, frase atribuída ao filósofo irlandês Edmund Burke. Nesse contexto, reflitamos: será que repetimos uma campanha militarista versus uma campanha civilista nesta eleição, assim 
como ocorreu em 1910?

Como ninguém é obrigado a estudar a história do Brasil tão a fundo como as 
pessoas que gostam ou que tem essa atividade como profissão - no meu caso só gosto mesmo - devo relembrar os acontecimentos da quinta eleição direta para presidente do Brasil após a proclamação da República, realizada no dia 1º de março de 1910, com os resultados somente sendo divulgados no dia 27 de julho daquele ano, mais de quatro meses depois. Nunca é demais frisar que não existia urna eletrônica, e o voto era “de papel”, técnica arcaica defendida ainda por uma minoria em pleno século XXI.

Para explicar o contexto histórico da eleição de 1910, devo remontar à eleição 
anterior, a de 1906, que alçou ao poder um civil, o advogado mineiro Afonso Pena. A 
sua eleição foi possível graças a um compromisso que assumiu com os estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, estados beneficiados e que detinham o poder sobre a política do preço mínimo para o café. E ele cumpriu esse compromisso, realizando a primeira compra de estoques de café pelo Governo Federal, trazendo para a União a responsabilidade sobre o controle e a valorização do preço do café, antes assumida por São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. E o período de grande prosperidade e controle inflacionário que o país passou a viver nessa época, teve as iniciativas do governo civil de Afonso Pena como motivo principal, fase que se prolongou até o governo de Wenceslau Brás, somente sendo interrompida pela 1ª guerra mundial.

O governo de Afonso Pena foi responsável por grandes investimentos em ferrovias, tendo construído a estrada de ferro Noroeste do Brasil, a tão sonhada ligação 
das ferrovias paulistas com as ferrovias paranaenses, o que permitiu a ligação do Sudeste brasileiro com o Sul, ainda impossível naquela época. Foi também o responsável pela ligação telegráfica do Rio de Janeiro com a Amazônia, além da transferência da capital de Minas Gerais, antes em Ouro Preto, para Belo Horizonte.

Aproveitando o período de equilíbrio financeiro do país, que vivia também um 
bom momento político, Afonso Pena comemorou o centenário da abertura dos portos brasileiros, em 1908, realizando uma grande exposição nacional, projetando uma imagem positiva do país para o mundo. Mesmo sendo um governo civil, não economizou recursos para a área militar, modernizando o Exército e a Marinha, investindo recursos para que 
novos armamentos fossem adquiridos e, inclusive, foi ele que tornou o serviço militar obrigatório no Brasil. A Marinha, com investimentos mais vultosos, também recebeu novos navios, incluindo a aquisição de encouraçados que reforçaram o poder de fogo das Forças Armadas brasileiras.

Em 1909, seu último ano de governo, quando ele iniciou as articulações para a 
indicação de um nome que certamente o sucederia, Afonso Pena acabou falecendo, assumindo o seu lugar o vice-presidente Nilo Peçanha.

E Nilo Peçanha, por divergências políticas, não abraçou o apoio à ascensão de 
outro civil ao Governo Federal, vindo a apoiar o candidato General Hermes da Fonseca, cuja grande parte do capital político que possuía havia sido fornecido exatamente por Afonso Pena. Quando modernizou o Exército e a Marinha do Brasil, Afonso Pena havia dado essa atribuição ao general Hermes da Fonseca, colocando esses grandes investimentos sob sua gestão, o que lhe deu visibilidade política. E a eleição de 1910 virou uma polarização entre o candidato militar apoiado por Nilo Peçanha, o general Hermes da Fonseca, do Partido Republicano Conservador, e Rui Barbosa, o Águia de Haia, um civil, que era jurista, advogado, diplomata, escritor, filólogo, jornalista, tradutor e o intelectual mais respeitado do Brasil naquele tempo, representante do Partido 
Republicano Liberal.

Nessa época eram convocados a votar “todos os homens com mais de 21 anos 
que não fossem analfabetos, religiosos e militares”. E, pasmem, o voto não era secreto, e existia grande influência dos chamados coronéis, geralmente ligados ao Poder Executivo Municipal ou ao poder militar de cada região do país. Dá pra imaginar as mais diversas formas de fraude eleitoral praticadas por esses detentores do poder local, sendo a mais 
comum a de obrigar as pessoas a votarem em determinado candidato. Como não havia Justiça Eleitoral, criada apenas em 1930, era impossível determinar se as eleições eram mesmo livres e democráticas como hoje.

Por incrível que possa parecer, havia naquela eleição de 1910 um total de 65 
candidatos a Presidente e 117 a Vice-presidente, mas, assim como está ocorrendo nesta eleição presidencial de 2022, a eleição se polarizou mesmo entre o General Hermes da Fonseca e o civil Rui Barbosa, cuja campanha chamada civilista, organizou grandes comícios nas grandes cidades do país, principalmente Rio de Janeiro e São Paulo, únicos estados que abraçaram a candidatura de Rui Barbosa, tendo sido a primeira vez na história do país que uma campanha de oposição empolgaria tanto o eleitorado.

E, em um país à época com cerca de 23 milhões de habitantes, apenas 2,78% da 
população votou, totalizando cerca de 640 mil votos. E o General Hermes da Fonseca, não se sabe como, após quatro meses de contagem de “votos de papel”, foi o vencedor, com uma votação de 403.768 votos. Rui Barbosa, o candidato civil derrotado, teve 222.822 votos.

Na realidade, cá entre nós, nunca saberemos realmente quem foi o vencedor dessa polarizada eleição de 1910, pois os votos do interior do país, exceto Rio de Janeiro e São Paulo, que apoiaram o candidato de oposição Rui Barbosa, demoraram cerca de quatro meses para chegar ao Rio de Janeiro, onde a contagem oficial e a ratificação do resultado ficavam a cargo, pasmem mais uma vez, do Executivo.

Não se pode comprovar, mas dizem alguns historiadores que o número de votos do general Hermes da Fonseca inicialmente iria ser lançado no boletim do resultado final como 400.000 votos. Porém, pra não ficar muito “na pinta”, como dizem, usaram o número quebrado de 403.768 votos.

Viva a urna eletrônica!! Viva a Democracia!!
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