COLUNA Adriano Lima Neves

O surgimento do futebol em Santa Leopoldina

Por Adriano Lima Neves

O Cachoeirano Futebol Clube, agremiação esportiva criada em 1933, foi o primeiro time de Santa Leopoldina a se tornar popular e o que mais representou a essência do futebol leopoldinense pelos gramados por onde jogou, nessas mais de oito décadas de existência. 

O Cachoeirano certamente é o time que mais nos traz à mente os grandes momentos de nostalgia do futebol leopoldinense, mas a história do futebol de Santa Leopoldina começou antes da existência dessa tradicional equipe, e mostra que ele não foi o primeiro time de futebol da nossa cidade e nem o primeiro time a utilizar o campo do Moxafongo para a realização de jogos de futebol.

Antes de falar sobre a história do futebol em Santa Leopoldina, devo lembrar ao leitor de O Leopoldinense que o futebol foi introduzido no Brasil por um paulista de origem inglesa, chamado Charles William Miller, que ao retornar de seus estudos na Inglaterra em 1894, trouxe na bagagem duas bolas de futebol, dois uniformes completos, uma bomba de ar e uma agulha, além de um livro com as regras desse novo esporte. 

Pouco mais de vinte anos depois que Charles Miller trouxe as primeiras bolas de futebol para o Brasil, esse esporte que inicialmente era jogado apenas por jovens da elite paulista e carioca, chegou a Santa Leopoldina. Isso é explicado pelo fato de que Santa Leopoldina também era uma cidade com uma elite sedenta de novidades, além do fato de que apenas os jovens dessa elite leopoldinense representavam a cidade nas competições esportivas oficiais. Um exemplo marcante disso é a carreira de tenista do ex-prefeito Djalma Coutinho, o maior jogador de tênis a representar Santa Leopoldina nos torneiros oficiais dessa modalidade.

E o futebol, logo que chegou a Santa Leopoldina, também era um esporte praticado pela elite, pois, para praticá-lo, era necessário pertencer a um clube social, como o Aliança Football Club ou a Alea-Agremiação Leopoldinense de Esportes Atléticos, as primeiras agremiações de futebol de Santa Leopoldina.

Não há muitas informações sobre a fundação do Aliança Football Club, embora exista até uma fotografia rara da equipe, tirada em 1928. O que se sabe é que o Aliança certamente foi o primeiro time de futebol de nossa cidade e que a qualidade do plantel era muito boa, tanto que era chamado de “team” forte pelos seus próprios adversários. Isso se confirma pela participação do Aliança Football Club como representante de Santa Leopoldina no Campeonato Capixaba da Primeira Divisão, em 1928, feito jamais conseguido por outra agremiação de nossa cidade.

Outro registro desconhecido da história do futebol em nossa cidade é que aqui morou o jogador de futebol Altino Marcondes, o Tatú, campeão paulista pelo Corinthians, campeão brasileiro pela Seleção Paulista e campeão sul-americano, em 1922, pela Seleção Brasileira. 

Além de termos o tricampeão Fontana enterrado em nosso cemitério local, tivemos como morador o ilustre jogador profissional Altino Marcondes, o Tatú, craque campeão sul-americano de futebol pela Seleção Brasileira, título conquistado no estádio das Laranjeiras, no Rio de Janeiro, no ano do centenário da Independência do Brasil, em 1922. 

Alcino chegou a Santa Leopoldina já com 28 anos de idade, no final de sua vitoriosa carreira, contratado pelo Aliança Football Club. Além de jogador de futebol, Altino era um excelente acrobata, tendo se apresentado em vários circos pela região. Enquanto morou em Santa Leopoldina, Altino foi o principal jogador do Aliança Football Club, tendo disputado o Campeonato Capixaba da Primeira Divisão, em 1928. 

E foi no dia 08 de julho de 1928 que os times do Aliança Football Club, de Santa Leopoldina, e o Terezense Football Club, de Santa Teresa, entraram para a história do futebol capixaba como os primeiros a jogarem uma partida de futebol entre equipes do interior válida pelo campeonato estadual da primeira divisão, com resultado favorável à equipe da terra dos colibris por 2 x 1, mesmo o Aliança tendo o craque Altino em campo. 

Depois de morar durante um ano em Santa Leopoldina, o jogador Altino retornou para Taubaté, no interior de São Paulo, sua terra natal, onde contraiu tuberculose, vindo a falecer em 24 de maio de 1932, com apenas 33 anos de idade. Seu corpo está enterrado no cemitério municipal de Taubaté, sendo o seu túmulo identificado com o número 153, pertencente à quadra 04, o que facilita uma pretensa visita a esse ícone do futebol de Santa Leopoldina.

Outro time criado antes do Cachoeirano Futebol Clube foi a Alea-Agremiação Leopoldinense de Esportes Atléticos, que apesar de não focar somente no futebol, era uma agremiação mais organizada e as informações sobre a sua fundação estão preservadas até os dias de hoje. 

Graças a essa preservação, sabe-se que a Alea  foi fundada em 14 de março de 1932 e na sua ata de criação consta como primeiro presidente o comerciante João Reisen, Vice-Presidente Amaro Bastos, Primeiro Secretário Vasco Amarante, Segundo Secretário Mário Espíndula, Primeiro Tesoureiro o farmacêutico Frederico Thinnes, Segundo Tesoureiro José Guimarães, Procurador e Zelador Nicanor Menezes e Secretário Geral Dalmácio Coutinho.

Quanto ao primeiro local onde se iniciou a prática do futebol em Santa Leopoldina, certamente foi o campo do Moxafongo, apesar de não haver qualquer registro sobre a data de sua construção ou de sua inauguração, pois já nos anos vinte do século passado há registros de partidas de futebol realizadas naquele local, hoje denominado Estádio Laerte Neves, pertencente ao Complexo Esportivo Hermínio Braz.

Em um domingo de 1927, mais precisamente no dia 03 de junho, o Samaritano Football Club, equipe recém criada em Vitória, anunciava uma excursão para a “aprazível” Santa Leopoldina, onde enfrentaria o forte time do Aliança Football Club. Esse pode ter sido o primeiro jogo oficial no antigo estádio do Moxafongo. 

Apesar de ser uma área particular, com vários proprietários ao longo dos anos, a área onde hoje estão localizados o Complexo Esportivo Hermínio Bráz e o Estádio Municipal Laerte Neves, já era usada para piqueniques e banhos de rio mesmo antes da existência do campo de futebol. O famoso “fundão do Osório”, aquele canto em que o rio Crubixá faz uma curva ladeando uma grande pedra, era o local preferido das famílias leopoldinenses para esses momentos de lazer.

Falando em rio Crubixá, esse não é um nome de rio exclusivo de Santa Leopoldina, pois é um nome muito usado Brasil afora para denominar rios e riachos onde se encontram seixos e pequenas contas e pedras para serem usadas em colares. Aqui mesmo no Espírito Santo, há localidades com esse nome em João Neiva, Alfredo Chaves e Iconha. O nome Crubixá em Tupi Guarani significa "lugar (rio/praia) onde se apanham seixos para enfeites".

Realmente a história do futebol de Santa Leopoldina é muito rica e cheia de detalhes pitorescos, iniciando pela forma como eram cobrados os ingressos para os jogos no antigo campo do Moxafongo. Como se tratava de um local aberto, atravessava-se uma corda na estrada de acesso ao campo, em frente à entrada do cemitério, e as pessoas só passavam dali em diante após o pagamento do ingresso. Quem não tinha dinheiro passava por dentro do Córrego Crubixá, ou usava a estrada que dá acesso à Cachoeira do Moxafongo, tornando o caminho mais longo e mais íngreme. Essa segunda opção acabou fazendo com que a cobrança do ingresso passasse a ser feita em um local com possibilidade de também barrar os que tentassem utilizar o caminho da cachoeira do Moxafongo para chegar ao campo de futebol. E a corda passou a ser esticada antes desse acesso, em frente à casa do Sr. Perim.

Além de se aventurar pelo Córrego Crubixá, outra opção que os garotos da minha geração tinham era contar com o coração generoso do sr. Dalmácio Nascimento, o apaixonado técnico do time, que, quando estava de bom humor, liberava a entrada de todos nós dizendo: - O quêêê!! Pode deixar entrar, são o futuro do Cachoeirano! 

E em alguns casos ele acertou na previsão.

 

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